Nesse último artigo abordaremos a Responsabilidade na Invasão de Privacidade na Internet.
A tutela jurídica dos direitos da personalidade, dentre eles, os direitos à privacidade, à intimidade e à imagem, já existia desde o Direito Romano através da actio injuriarum, embora seu reconhecimento como direito subjetivo seja recente.
No Brasil os direitos da personalidade foram incorporados através de Tratados Internacionais e através de algumas leis extravagantes, mas a sua consagração se deu através da Constituição Federal de 1988.
O Código Civil embora tenha dedicado um capítulo específico, pouco desenvolveu o tema deixando para a jurisprudência, para os doutrinadores e para leis especiais abordarem de forma mais abrangente.
A Constituição Federal, no art. 5º, inciso X, resguardou alguns desses direitos da personalidade: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
No mesmo compasso da Magna Carta a matéria também foi abordada de forma não taxativa no Código Civil, art. 21: “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma”.
Outra disposição que busca proteger a intimidade do cidadão na Constituição Federal é inciso XII, art. 5º: “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas …”.
Assim a Carta Magna assegurou o respeito à vida privada e à intimidade do cidadão que tem o direito de se corresponder com outros usuários via e-mail sem nenhuma interferência, garantindo que o conteúdo da correspondência não seja violado por terceiros curiosos ou interessados.
Embora muitos doutrinadores façam confusão entre os conceitos de vida privada e intimidade ou utilizem privacidade como gênero, se faz necessário distingui-los, “Assim, o conceito de intimidade relaciona-se às relações subjetivas e de trato íntimo da pessoa humana, suas relações familiares e de amizade, enquanto o conceito de vida privada envolve todos os relacionamentos da pessoa, inclusive os objetivos, tais como relações comerciais, de trabalho, de estudo etc”.
Intimidade tem origem no latim, “intimus”, que significa o mais profundo, estreito, indicando a qualidade ou o caráter das coisas e dos fatos, que se mostram estreitamente ligados, ou das pessoas, que se mostram afetuosamente unidas pela estima.
Também não se confunde com direito à imagem, que segundo Maria Helena Diniz é: “o de ninguém ver seu retrato exposto em público ou mercantilizado sem seu consenso e o de não ter sua personalidade alterada material ou intelectualmente, causando dano à sua reputação”, assim compreende também: “o uso e à difusão da imagem; à imagem das coisas próprias e à imagem em coisas e publicações; de obter imagem ou de consentir em sua captação por qualquer meio tecnológico”.
Embora todos esses direitos sejam autônomos, de forma que as lesões possam ocorrer de forma independente, em certos casos, elas podem aparecer conexas, onde uma violação atinja ao mesmo tempo a honra, a intimidade e a imagem.
Com base no que foi visto até o momento concluímos que tanto o direito à vida privada como o direito à imagem, podem ser considerados como limitadores do direito constitucional à informação, porém, sem esquecer que nenhum direito previsto na Carta Magna pode ser encarado de forma absoluta, pois todos casos comportam exceções.
As violações na web dos direitos à intimidade e da imagem, estão muitas vezes conexas com as violações dos direitos autorais, onde a divulgação da maior parte das invasões e manter sempre o sistema operacional e o antivírus atualizado de forma a eliminar os vírus que podem conter cavalos de Tróia e eliminando também as portas de serviço ou backdoors.
Mas qual seria a dimensão real do dano causado por esses programas? Uma vez estabelecida à conexão entre um computador desguarnecido ou infectado por cavalo de tróia a relação passa a ser de subordinação e monitoramento através do acesso remoto pela Rede, ou seja, permite ao hacker o controle total do computador do usuário .
Através desse monitoramento é possível deletar, modificar, transferir e criar arquivos em computar, além de possibilitar o roubo de senhas digitadas com o computador desligado que serão repassadas no próximo acesso à Internet.
Além disso, essas invasões permitem que os sites hospedados em servidores sejam redirecionados para outros lugares, como sites pornográficos, por exemplo, ou alterados com montagens que possam ferir a honra de outras gerando direito à pesadas indenizações por danos morais.
Em decorrência das controvérsias geradas, a questão acerca dos cookies também guarda uma expressiva relação com o direito à privacidade.
Os cookies foram criados pela Netscape em 1995 para serem utilizados no seu browser “netscape navigator”, e serviam para facilitar a navegação pela Rede ao possibilitar a troca de informações entre o computador do usuário e uma página na web de forma que ela se tornasse personalizada, deixando o ambiente mais fácil e agradável.
Com essa troca de informações é possível que um website inteiro e não apenas uma homepage seja personalizada, inclusive que todas as propagandas sejam veiculadas segundo o perfil do usuário fornecido pelos cookies.
O que deve ser coibido então é o abuso da utilização, de forma que toda vez que um cookie fosse encaminhar informações do usuário deveria aparecer uma mensagem prévia solicitando o encaminhamento como também o conteúdo das informações.
Assim, não resta dúvida de que diminuiria sensivelmente a possibilidade de se indagar sobre uma eventual invasão de privacidade, pois estaria em conformidade com o art. 43, § 2º do Código Brasileiro do Consumidor: “A abertura de cadastro, ficha, registro, e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele”.
Mas na realidade isso não ocorre, e mesmo que o internauta desabilite os cookies no seu computador ele não estará livre de problemas, pois a grande maioria dos sites, barra ou cria algum tipo de obstáculo à entrada do usuário.
Lei 12.737 – Lei Carolina Dieckmann:
Batizada de Carolina Dieckmann, a lei 12.737 altera o Código Penal, tipificando e tornando crime algumas situações antes não tipificadas pelo Direito Penal, e representou avanços no combate aos crimes cibernéticos.
Uma das principais alterações dessa lei foi à tipificação de um novo tipo penal: a invasão de dispositivo informático, por meio da inclusão do Art. 154-A no Código Penal: “Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita”.
Além de inserir também o crime de invasão de equipamentos, a referida lei modifica ainda dois artigos do Código Penal. Sendo que agora é crime a “interrupção ou perturbação de serviço telegráfico, telefônico, informático, telemático ou de informação de utilidade pública”. Assim, como também tipificou também a maneira como o cartão bancário é concebido em um processo. Com o advento da lei, os cartões passam a ser equiparados a documentos particulares em casos de falsificação.
Ficou evidente que a evolução gerada com a informatização e com a velocidade dos atingida pelos meios de comunicação estão criando um novo mundo globalizado, uma nova sociedade capitalista.
Vimos que a utilização da Internet de forma indiscriminada e irresponsável pode acarretar as mais variadas espécies de danos, e é exatamente nesse ponto que se faz necessário a apresentação desse estudo.
Então, a Responsabilidade pela má utilização e os eventuais danos causados não só da Rede, mas em todos os outros meios eletrônicos é um tema novo e intrigante que requer uma maior atenção dos operadores do direito.
A medida em que os problemas vão surgindo e que a sociedade global passa a se preocupar é dever de todos nós buscar soluções rápidas e eficientes.
Mas não obstante dessas preocupações, é possível verificar que as leis brasileiras já estão sendo aplicadas para alguns dos crimes praticados no ambiente virtual, sejam eles praticados contra a honra, contra a propriedade industrial e intelectual, ou qualquer outro que o ordenamento jurídico possibilite.
Assim, é possível uma vítima obter indenização pelo prejuízo material ou moral sofrido, bastando, que a vítima exerça o seu direito de buscar na Justiça a responsabilização dos infratores, diminuição assim, a certeza que os criminosos têm acerca da impunidade.
A Responsabilidade Civil nos meios eletrônicos deve ser entendida sob a ótica do novíssimo Direito Eletrônico, mas sem jamais deixar de lado os laços doutrinários construídos com outros ramos do direito.
Flávio Henrique Azevedo Inacarato
Advogado, Chief Legal Officer (CLO), Co-fundador da empresa AvaUnity, investidor, membro de diversos conselhos consultivos e Membro Consultor da Comissão Especial de Direito para Startups da OAB Nacional. Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas em 1997. Inscrito na OAB / SP nº 159.248 (220.233). Atuando na advocacia há mais de 20 anos em empresas nacionais e estrangeiras, com foco em Direito Societário, Civil, Internacional, Contratual, Consumidor e Novas Tecnologias e Startups.
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